UMA NOVA GUERRA FRIA
Manuel Begonha
Presidente da Mesa da Assembleia Geral
Estamos a viver as sequelas de um choque de sistemas económicos, a industrialização socialista de modelo chinês versus o capitalismo financeiro neoliberal.
Trata-se de uma nova guerra fria contra a China e seus potenciais aliados económicos, como a Rússia, a Ásia Central, Sul e Leste Asiático.
O processo teve como causa próxima a necessidade que a Rússia teve de desenvolver a defesa preventiva das duas províncias do leste ucraniano, com a sequente invasão que serviu de pretexto para impor um severo programa de sanções há muito projectado pelos EUA e que a UE diligentemente seguiu.
Não deixamos de estar perante uma guerra por procuração entre a China e os EUA, tendo sido a Rússia a escolhida como o primeiro alvo a abater.
O comércio e investimento europeus, até ao desencadear desta guerra, desenvolviam-se com crescente vantagem mútua entre a Alemanha e outros países e a Rússia e China.
A energia fornecida em abundância a preço competitivo, iria dar um salto relevante com o gasoduto Nord Stream 2.
Chegariam divisas à Europa para pagar estas importações, com a exportação para a Rússia de mais produtos manufacturados industriais, como os da indústria automóvel, para além de variados investimentos financeiros.
Este comércio e investimento bilateral foi travado por um longo prazo, uma vez que a NATO - essa relíquia sobrante da guerra fria que tem feito mais estragos do que prevenção - confiscou as reservas estrangeiras da Rússia em euros e libras esterlinas.
Estamos assim a ser conduzidos a uma modalidade de guerra total, em que a moeda, ou seja o factor dólar é utilizado como instrumento determinante.
Biden disse recentemente "que as sanções económicas são um novo tipo de política com o poder de infligir danos que rivalizam com o poder militar".
Não implicando Forças Armadas, provoca danos dificilmente reversiveis pelo oponente.
Os EUA estão também determinados a gerir a Europa a todo o custo.
Mas, a balança de pagamentos da UE e a taxa de câmbio do euro em relação ao dólar, irão ser afectados.
Para não verem o fornecimento cortado, os europeus terão de pagar o gás russo em rublos.
O gás, petróleo e cereais russos passarão a ser comprados aos EUA, bem como ocorrerá um enorme incremento na importação de armamento.
O Gás Natural Liquefeito (GNL) dos EUA, será muito mais caro e o respectivo fornecimento apenas normalizará com a construção de capacidade portuária suficiente , o que irá demorar.
A escassez de energia aumentará significativamente o preço mundial do gás e petróleo.
Os preços dos alimentos irão subir bem como os fertilizantes, face à interrupção das importações da Rússia e da Ucrânia.
Estas perturbações comerciais deixarão em aberto a forma como a UE equilibrará os seus pagamentos aos EUA.
Por outro lado devido ao aumento dos interesses proteccionistas daqueles, as exportações entrarão mais dificilmente, agravadas com a entrada em declínio do comércio livre global.
É lamentável que a UE não se tenha apercebido do enorme embuste em que se deixou envolver, nem sequer se preocupando em valorizar a vida do povo ucraniano, ao não fazer qualquer esforço visível para acabar com esta guerra.
Ver: Bruno Beaklini- Monitor do Médio Oriente
Michael Hudson - The vineyard of the saker