Subordinada ao titulo
"45
Anos do 25 de Abril e o fim do
colonialismo português"
o presidente da direcção da ACR, na qualidade de presidente da Mesa da Assembleia da Paz" proferiu a intervenção que se transcreve:
Cumpre-me
em primeiro lugar felicitar as organizações promotoras deste evento pela
importância de que se reveste nos dias de hoje, 45 anos passados da data
gloriosa do 25 de Abril de 1974, debruçarmo-nos sobre os acontecimentos, as
motivações, as consequências e tudo quanto for possível da enorme herança da
Revolução de Abril, que o mesmo é dizer das conquistas da revolução.
Dessa
herança faz parte o fim do colonialismo português. Aliás, o Programa do
Movimento das Forças Armadas, que é bom recordar foi a Lei Constitucional até à
promulgação da Nova Constituição da República Portuguesa de 1976, impunha já ao
Governo Provisório:
“B-
Medidas de curto prazo
8.a-Reconhecimento
de que a solução das guerras no ultramar é política e não militar
b-Criação de condições para um debate franco
e aberto, a nível nacional, do problema ultramarino
c-Lançamento dos fundamentos de uma política
ultramarina que conduza à paz.”
Abro
aqui um parentesis para dizer e relevar a importância da leitura e releitura
deste documento, o PMFA, em toda a sua extensão, para se entenderem as
motivações e os objectivos que nortearam os militares do MFA. Quem o fizer,
munido dum conhecimento mínimo do processo
revolucionário desencadeado em 25 de Abril de 1974, decerto não ignorará que a
Democracia Portuguesa nasceu da vontade histórica do MFA e do Povo de Portugal. Estes sim os
verdadeiros pais da Democracia!
Fecho
o parentesis,voltando à questão do colonialismo.
Na
sequência da vitória dos aliados na II Guerra Mundial assistimos a uma onda de
libertação dos povos subjugados pelo colonialismo, varrendo todo o planeta.
Isto
mesmo reflecte a Carta das Nações Unidas que acolhe e integra nos seus objectivos
a concretização das legítimas aspirações daqueles povos.
Portugal,
um dos mais antigos impérios coloniais, tendo requerido a sua admissão à ONU em
1946, só é autorizado a entrar em 1955,
ao mesmo tempo que a Espanha e a Itália. As afindades do governo de Salazar com
o fascismo alemão são a principal causa deste adiamento.
Com
a entrada na ONU, Portugal fica sujeito, ao estabelecido no Capítulo XI da
Carta- Declaração relativa a territórios não autónomos:
“Artº.
73 da Carta das Nações Unidas
Os
membros das Nações Unidas que assumiram ou assumam responsabilidades pela
administração de territórios cujos povos ainda não se governem completamente a
si mesmos reconhecem o princípio do primado dos interesses dos habitantes
desses territórios e aceitam, como missão sagrada, a obrigação de promover no
mais alto grau, dentro do sistema de paz esegurança internacionais estabelecido
na presente Carta, o bem-estar dos habitantes desses territórios,...
b.
Promover o seu governo próprio, ter na devida conta as aspirações políticas dos
povos e auxiliá-los no desenvolvimento progressivo das suas instituições
políticas livres,...
e.
Transmitir regularmente ao Secretário-Geral, para fins de informação, sujeitas
às reservas impostas por considerações de segurança e de ordem constitucional,
informações estatísticas ou de outro carácter técnico relativas às condições
económicas, sociais e educacionais dos territórios pelos quais são
respectivamente responsáveis...
Salazar,
avesso aos ventos da História, contorna o problema transformando as colónias em províncias
ultramarinas e afirmando Portugal como uno e indivisível, do Minho a Timor.
Em
1960, a Assembleia Geral da ONU pressiona o Governo Português exigindo o
cumprimento do establecido na Carta das Nações Unidas:
“a)
Entendia que os territórios sob administração de Portugal, abaixo in-dicados,
eram não autónomos, no espírito do capítulo XI da Carta e demais resoluções
pertinentes:
—
Arquipélago de Cabo Verde;
—
Guiné, chamada «Guiné Portuguesa»;
—
São Tomé e Príncipe e dependências;
—
São João Baptista de Ajudá;
—
Angola, incluindo o enclave de Cabinda;
—
Moçambique;
—
Goa e dependências, chamado o «Estado da Índia»;
—
Macau e dependências;
—
Timor e dependências;
b)
Declarava existir uma obrigação por parte do governo de Portugal de prestar
informações, nos termos do capítulo XI da Carta, acerca destes territórios e
que a mesma devia ser cumprida sem demora;
c)
Solicitava que as informações sobre as condições existentes naqueles
territórios fossem enviadas ao Secretário-Geral;
d)
Convidava os governos de Portugal e Espanha a participarem nos trabalhos do
Comité de Informações Relativas aos Territórios não Autónomos.”
O
Governo Português mantem-se intransigente na sua política para enfrentar o movimento
descolonizador, definida na revisão constitucuional de 1951: Portugal uno e
indivisivel do Minho a Timor, não tem “Territórios não autónomos” abrangidos
pelo Artigo 73º da Carta”
Em
fevereiro de 1961 iniciam-se em Angola as operações de guerrilha.
Em
Dezembro de 1961 a União Indiana invade o Estado Português da Índia.
Neste
mesmo ano de tão penosos desaires para a ditadura, forças opositoras ao regime
em Portugal lograram levar a cabo acções militares importantes: O sequestro, em
Janeiro de 1961, do paquete Sta Maria e a Revolta de Beja, em 31 de Dezembro/01
de Janeiro de 1962.
Em
Janeiro de 1963, inicia-se a guerra na Guiné e em Setembro de 1964, em
Moçambique.
Em
1965 o Daomé ocupa o Forte de S.João Baptista de Ajudá.
O
Governo de Salazar, ignora os ensinamentos das experiências vividas por outras
potências coloniais, aposta numa forte campanha de mobilização da população,
despreza qualquer hipótese de diálogo com os movimentos de libertação das
colónias que apelida de terroristas ao
serviço de potências estrangeiras e aposta numa vitória militar na defesa da
pátria e do território nacional, segundo os seus próprios conceitos.
A
guerra colonial prossegue e intensifica-se como cresce e se intensifica a
contestação ao regime.
As
baixas em combate sofridas pelas nossas tropas, que as autoridades procuram,
sem êxito, esconder, vão minando o fervor nacionalista que o regime incutira na
população e na juventude portuguesa.
A
contestação da juventude universitária assume claramente a guerra colonial como
alvo; A oposição democrática, em 1969, no II Congresso Republicano de Aveiro,
coloca também a questão colonial como ponto forte da agenda; As eleições
legislativas, nesse mesmo ano, animadas pelas ilusões da “Primavera Marcelista”
que se revelaram, no essencial, um pouco mais do mesmo, proporcionaram no entanto
muitas e excelentes intervenções e debates ideológicos em torno da questão
colonial.
Em
1970, 10 ex-oficiais alunos da Academia Militar, no IST, desertam, o que
constitui uma forte machadada na imagem do regime, com repercuções
internacionais.
Em
1971, a ARA leva a cabo uma espectacular acção de sabotagem na Base Aérea de
Tancos, com destruição de várias aeronaves militares.
Nos
alvores da Revolução de Abril toda a juventude portuguesa daquela época estava
ou viria a estar envolvida na guerra colonial. Guerra, que o regime assumia
como simples operações de defesa da soberania, da qual resultaram 8.831 mortos
e 14.000 deficientes do lado das forças armadas portuguesas e inúmeras vítimas
do lado Guerrilha e das populações locais.
O
país encontrava-se exaurido pelo esforço
de guerra nas três frentes, que Já aborvia mais de 40% do orçamento do Estado,
não conseguindo fazer face às necessidades de modernização do equipamento das
forças armadas. A situação agravara-se ainda por força do embargo internacional
à venda de armamento a Portugal. No
terreno, a guerrilha exibia, em alguns casos, equipamento mais avançado do que
o utilizado pelas nossas tropas.
A
isto acresciam grandes dificuldades no recrutamento. 25% dos jovens recenseados
faltavam ao serviço militar(170.000 nos treze anos de guerra)
Também
o recrutamento para os quadros das forças armadas era cada vez mais difícil.
Os
quadros militares, forçados ao desempenho de sucessivas comissões de serviço -
não raro o intervalo entre comissões era apenas de alguns meses – exibiam já,
claramente, sinais de cansaço e alguma desmoralização.
A
situação militar no terreno com diferenças nas três frentes, caminhava para o
insustentável. Mais perto na Guiné, que já havia mesmo declarado a
independência e mais distante em Angola.
É
este, em traços muito largos, o contexto em que oficiais das Forças Armadas
Portuguesas, dominantemente no posto de capitão, se começam a movimentar- primeiro por razões
meramente corporativas- logo passam ao questionamento da legitimidade da
guerra, que sabiam impossível de vencer, desembocando naturalmente no
imperativo do derrube da ditadura que teimosamente, contra tudo e contra todos
se recusava a aceitar “os ventos da história” e mantinha Portugal à margem dos
principais avanços civilizacionais conquistados pela Humanidade.
A
Descolonização é assim uma das portas que Abril abriu, um dos 3 Ds do MFA.
Face
a tentativas de interpretação do nº8 do PMFA ancoradas em visões
neocolonialistas, em 27 de Julho de 1974, já com Vasco Gonçalves como Primeiro
Ministro do II Governo Provisório, a Lei 7/74, vem reconhecer de forma
explícita o direito à independência das
colónias.
Esta
Lei marca, a meu ver, o início do fim do colonialismo português, contudo não
conseguiu evitar as novas investidas que, em desespero de causa, os adversários
da descolonização viriam ainda a concretizar nas colónias, em particular, em
Moçambique e em Angola. Na metrópole o 28 de Setembro de 1974 eo 11de Março de
1975 têm tambem muito destas motivações.
Abriu-se
assim o caminho para acabar com a guerra colonial nas três frentes: Guiné,
Angola e Moçambique.
O
reconhecimento da legitimidade representativa dos povos das colónias pelos
movimentos de libertação, conquistada na luta armada, proprcionou a criação de
novos países de expressão portuguesa, num processo que, apesar das vicissitudes
próprias de qualquer alvorecer, mais turbulento, menos turbulento, nos deve
orgulhar a todos: Porque não enjeitámos um passado comum de mais de 4 séculos e
porque soubemos, de forma irrepreensível, pedindo meças a qualquer outro povo
que tenha vivido idêntica epopeia, que os houve, integrar na sociedade
portuguesa mais de 600 mil refugiados das ex-colónias.
O
reconhecimento, por Portugal, da independência da Guiné(declarada em 1973) tem
lugar em 1974. A independência de Moçambique
e de Angola ocorrem em 1975.
Também
o reconhecimento da integração dos territórios do Estado da ìndia na União Indiana
da Fortaleza de S.João Baptista de Ajudá no Daomé, ocorem ainda em 1974, a
independência de Cabo Verde e de S.Tomé e Principe em1975, a integração de
Macau na Pepública Popular da China em1999 e finalmente independência de Timor
Leste em 2002.
Este
último acontecimento, precedido dum doloroso processo que conduziu a 24 anos de
ocupação militar indonésia, marca o fim do colonialislmo português.
A
Humanidade ganhou uma comunidade de nações livres e iguais, falando português,
com um Futuro para construir.