Intervenção de Henrique Mendonça




Como representante da Associação Conquistas da Revolução é com muito prazer
e alegria que participo nesta vossa iniciativa.
Esta jovem Associação, é o produto do sentimento expresso por várias centenas
de cidadãos de não deixar cair no esquecimento os valores e ideais da
Revolução iniciada em 25 de Abril de 1974, um dos períodos mais belos da nossa
história, e fazer deles um guia de acção para as lutas do presente e do futuro.
Porque uma das grandes conquistas da revolução, foram as
nacionalizações permitam-me que inicie esta minha informação com um
breve enquadramento histórico e me perdoem se abusar da vossa
paciência.
É que falar deste tema tão apaixonante não é obra fácil.
Este período, está intimamente ligado ao general Vasco Gonçalves, hoje
aqui homenageado.
Vasco Gonçalves foi o único primeiro ministro do Portugal, pós 25 de
Abril, que de uma forma denodada defendeu os direitos e os interesses
do povo português, principalmente das classes mais desfavorecidas.
No dizer de Fidel Castro “ a sua luta incansável pelas causas justas da
humanidade perdurará sempre na recordação dos revolucionários que
conhecem a sua obra”.
Antes do 25 de Abril de 1974 existiam em Portugal 6 grandes grupos económicos,
sendo o mais importante o Grupo CUF.
Estes grupos tinham uma característica comum que era o domínio de um banco e
de uma ou mais companhias de seguros e distribuíam entre si o predomínio dos
grandes meios de produção.
Mais de 2 centenas de empresas estavam integradas ou ligadas a estes grupos.
Centenas de milhar de trabalhadores eram dependentes deles.
Na altura dizia-se que 6 pessoas, em almoço no Tavares rico, traçavam os
destinos da nossa Pátria.
A luta que então era desenvolvida contra a actividade destes grupos económicos
é reflectida no Programa do MFA, dado a conhecer em 25 de Abril de 1974, que
de uma forma tímida já dava a orientação para:
• Uma nova política económica, posta ao serviço do Povo Português, em
particular das camadas mais desfavorecidas, tendo como preocupação
imediata a luta contra a inflação e a alta excessiva do custo de vida, o que
necessariamente implicará uma estratégia antimonopolista;
e para:
• Uma nova política social que, em todos os domínios, terá essencialmente como
objectivo a defesa dos interesses das classes trabalhadoras e o aumento
progressivo, mas acelerado, da qualidade da vida de todos os portugueses.
Com a Revolução de Abril
• O salário mínimo nacional foi implementado pela primeira vez no nosso país.
• Foram congelados salários a partir de certo montante.
• O abono de família foi aumentado e passou a abranger mais de meio milhão de
crianças;
• Mesmo no desemprego passaram a ficar assegurados os benefícios da
Previdência.
• Os valores das pensões sociais foram duplicados para os inválidos e para os
maiores de 65 anos;
• Foi implementado pela primeira vez a licença de parto, alargado o período de
férias para 30 dias, as férias passaram a ser pagas e passou a existir o
subsídio de Natal
• Foi reduzido o horário de trabalho;
• Foram tomadas medidas de ajuda aos desempregados;
• Foi criado o embrião do Serviço Nacional de Saúde universal e gratuito;
Estas conquistas, que hoje fazem parte do nosso quotidiano e estão seriamente
ameaçadas, foram conquistadas com muita luta, contra as sabotagens e ardis
que o capital monopolista a cada passo efectuava.
Uma das primeiras tentativas do capital monopolista para derrubar o espírito
revolucionário emergente da Revolução dos Cravos passou-se pouco tempo
depois do segundo governo provisório ter tomado posse.
Os capitalistas com muita arte criam um “Movimento Dinamizador Empresa/
Sociedade”, que ficou conhecido pelo MDE/S.
Este movimento, ligado aos grandes monopólios nacionais, afirmava pretender
expandir-se às pequenas e médias empresas, mas só permitia que fosse dirigido
apenas por representantes das já mencionadas seis famílias.
Os projectos apresentados, a que a comunicação social deu grande ênfase, não
eram mais que a tradução das ambições do grupo CUF.
Aproveito para contar uma situação vivida por mim e que me deu para perceber
os tentáculos do capitalismo e os perigos que a nossa revolução corria.
Os dirigentes deste movimento pedem uma audiência ao então primeiro-ministro,
General Vasco Gonçalves.
O governo decidiu que além do primeiro-ministro iria também o ministro sem
pasta Major Vítor Alves, o ministro da economia Rui Vilar e o ministro das
finanças Silva Lopes. Acontece que à hora da audiência e já com os
representantes do MDE/S à espera, os ministros ainda não tinham aparecido e
não se conseguia contactar com eles.
Vasco Gonçalves resolve avançar e “mobiliza” os dois membros do gabinete
presentes para o acompanharem, capitão Luis Macedo e eu próprio.
A audiência lá decorreu com os capitalistas a “venderem” o seu peixe.
Aceitamos os dossiers e a audiência terminou.
Muito mais tarde, já depois do 25 de Novembro, Vasco Gonçalves confidencioume
que tinha sido um dos piores dias da sua vida….
Quanto a Rui Vilar, Silva Lopes e Vítor Alves sabemos quais as águas que
escolheram…
Uma das formas como os capitalistas procuravam sabotar a economia era a da
saída e trocas de papel moeda. Esta prática teve o seu embrião antes do 25 de
Abril.
Em 1973 os diversos bancos centrais estrangeiros apresentaram para troca ao
Banco de Portugal 600 mil contos (cerca de 3 milhões de euros) em notas
emitidas pelo nosso banco emissor, o banco de Portugal. O que significava que o
cambio das notas portuguesas era feito no país estrangeiro e que em 1973
representou 600 mil contos.
Mas em 1974 o volume de notas apresentadas duplicou,
e só nos primeiros 4 meses de 1975 atingiu os 600 mil contos.
Este procedimento era uma forma de “caçar” as economias dos emigrantes
portugueses.
Muitas das notas que os capitalistas fizeram sair do país eram depois vendidas
aos nossos emigrantes.
Um dos meios utilizados, para o cambio, era através da Agencia do Banco Pinto e
Sotto Mayor, em Paris.
Essa agência, no período que antecedeu o 11 de Março, esteve quase a tornarse
um Banco Francês.
A situação só não foi conseguida por uma unha negra.
A vigilância do Sindicato dos Bancários apoiada pelo MFA conseguiu evitar o pior.
Ao ter conhecimento do que se estava a passar em França, o Ministro das
Finanças, Silva Lopes, acabou, finalmente, por aceitar que a única forma de
evitar a sangria das divisas era com a nacionalização.
Este é apenas um dos muitos episódios da sabotagem económica.
As respostas dadas, pelo movimento de massas, apoiado pelo MFA, às diversas
tentativas de sabotagem económica e de entrave ao caminho revolucionário
lança a reacção, em acto de desespero, num golpe armado, encabeçado pelo
então general Spínola (primeiro presidente da república pós 25 de Abril).
A unidade Povo-MFA conseguiu pôr termo a esta aventura reaccionária que ficou
na história com o nome de 11 de Março.
As medidas que na sequência foram tomadas conduziram às nacionalizações.
A 14 de Março, considerando que o sistema bancário, na sua função privada, se
tem caracterizado como um elemento ao serviço dos grandes grupos
monopolistas em prejuízo da satisfação das reais necessidades das pequenas e
médias empresas e do povo em geral.
Que o sistema bancário é a alavanca da economia, que é por meio dele que se
pode dinamizar a actividade económica.
É nacionalizada a banca e os seguros.
Foi um acto de patriotismo sem precedentes da nossa história recente e que
evitou a drenagem das nossas reservas financeiras.
Para a tomada de consciência da importância deste acto muito contribuiu o
Sindicato dos Bancários e a vigilância popular existente.
Em Abril de 1975 foram nacionalizados vários sectores fundamentais da nossa
produção e da economia (energia, transportes e indústria) e deu-se mais um
passo fundamental na edificação da Reforma Agrária com a expropriação das
propriedades de sequeiro com mais de 500 ha.
A nacionalização da banca e das companhias de seguros, dos sectores básicos
da produção, das principais empresas de transportes e comunicações, destruíram
as bases do capitalismo monopolista de estado e os grupos económicos
monopolistas, que dominavam a economia e a política portuguesa antes do 25 de
Abril.
Quer o PS, quer o PCP e o MDP/CDE saúdam as nacionalizações.
A 16 de Abril, promovida pelo PCP, MDP/CDE, MES, FSP e CGTP, realiza-se
uma manifestação de apoio e regozijo às nacionalizações.
É interessante notar que nessa mesma altura, no mesmo dia em que o PS saúda
as nacionalizações, é divulgada uma carta da União dos Partidos Socialistas da
CEE e do Grupo Socialista do Parlamento Europeu dirigida a Vasco Gonçalves,
persuadindo o MFA a afastar-se do PCP, exaltando o comportamento de Mário
Soares e insinuando a possibilidade de promover ou impedir um auxilio financeiro
da CEE conforme a opção política tomada.
Em 15 de Abril de 1975 a nota oficiosa que saiu da reunião do Conselho de
Ministros informava das razões da necessidade das nacionalizações e o
objectivo do pleno emprego como fundamental para o avanço da política
económica.
Para finalizar gostava de fazer referência a um relatório da OCDE - Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Económico - elaborado por peritos do
MIT (um deles chegou a elaborar pareceres para o FMI) que se deslocaram a
Portugal entre 15 e 20 de Dezembro de 1975 onde era referido:
“Portugal goza, inesperadamente, de boa saúde económica, em comparação com
outros países da OCDE, a experiência portuguesa não parece muito pior que a
média”
Hoje, tal como ontem, a unidade dos trabalhadores e a sua luta determinarão a
ruptura com a actual política e a construção de uma sociedade mais justa, mais
humana, mais solidária, a sociedade socialista.