Intervenção de Modesto Navarro



Intervenção de Modesto Navarro no Debate - 35 Anos da Constituição da República. Acção e papel dos Governos de Vasco Gonçalves

A ALIANÇA POVO-MFA E SUAS CONQUISTAS NA REVOLUÇÃO DO 25 DE ABRIL

Caras e caros amigos

Com esta iniciativa da Associação Conquistas da Revolução, queremos manter e repor os ideais do 25 de Abril e as conquistas iniciadas em 1974 e 1975. Anos fundamentais na construção de uma democracia política, económica, social e cultural, objectivos que hoje continuam a estar na ordem do dia da luta dos trabalhadores e do povo português.

Queremos lembrar, desde logo, a intervenção popular e dos trabalhadores na transformação de um golpe militar numa revolução. A participação organizada, a alegria da vitória no dia 25 de Abril e a histórica manifestação do 1º de Maio de 1974, ficaram a marcar e a impulsionar a construção das liberdades fundamentais, o exercício pleno da vida política e da intervenção decisiva dos que lutavam contra o fascismo na clandestinidade e na resistência quotidiana dos trabalhadores e do povo.

Em 1974, milhares de estudantes e jovens trabalhadores estiveram em todo o país, na intervenção cívica, social e cultural, nas campanhas de alfabetização e na organização de acções de esclarecimento e de apoio à revolução do 25 de Abril.

Nesta sessão, queremos homenagear e projectar a figura e o exemplo fundamental do General Vasco Gonçalves, grande revolucionário e militar de Abril, o melhor primeiro-ministro de sempre dos trabalhadores e do povo português.

O programa de dinamização cultural do MFA foi apresentado 6 meses após o 25 de Abril, na vigência do III governo provisório. O 1º Ministro Vasco Gonçalves disse, então, que um dos principais objectivos “era levar os militares, o Movimento das Forças Armadas, às populações, e apoiá-las na tomada de consciência dos problemas que elas tinham”.

As campanhas também influenciaram a democratização das forças armadas. Era uma aprendizagem das populações e dos militares, na aliança Povo-MFA que então foi construída.

Com insuficiência de meios humanos e técnicos, mas com a adesão das populações, forças democráticas e associações locais, realizou-se um intenso trabalho de apoio social e cultural, de organização popular, de intervenção na abertura de estradas, de electrificações de aldeias, de colocação de médicos e enfermeiros em zonas até aí com grandes dificuldades.

Muitas populações de vilas e aldeias tiveram pela primeira vez acesso a consultas especializadas. Creches e jardins-de-infância foram criados, dirigidos por comissões locais, com o apoio do MFA.

Companhias de teatro realizaram digressões por muitas zonas do país, espectáculos de música, cinema e outros passaram a fazer parte dessas acções de desenvolvimento cívico, cultural e associativo. Na Comissão Dinamizadora Central havia equipas de técnicos e de animadores que criavam condições para essas iniciativas no terreno. Escritores, artistas e outros intelectuais aderiam às campanhas e participavam nas iniciativas com os militares e civis.

Na Serra de Montemuro, por exemplo, na aldeia da Gralheira, Concelho de Castro Daire, finalmente foi aberto um estradão para poderem levar os doentes para o hospital de Castro Daire. Até aí, iam em padiola, aos ombros de gente da terra, até à estrada, que ficava bem longe.

Em diversas regiões do país, as populações organizaram-se em comissões de moradores e de trabalhadores, em associações cívicas, culturais e desportivas.

A eleição e instalação de comissões administrativas para as câmaras municipais e juntas de freguesia, logo depois do 25 de Abril, deram início à democratização e transformação do poder local, que era autocrático e controlado pelo fascismo, pelos senhores da ANP – União Nacional. Abriram-se assim novos caminhos de afirmação das populações locais e de realização de velhas e novas aspirações dos concelhos e das freguesias.

Por exemplo no distrito de Viseu, em Sernancelhe, Penedono, São Pedro do Sul e Castro Daire, em concelhos difíceis, os militares avançavam para novas formas de apoio aos agricultores, na criação de melhores condições de produção. Veterinários, engenheiros e outros quadros especializados faziam o seu trabalho ao lado dos militares e das populações.

Os partidos políticos organizaram-se pelo país, bem como os sindicatos. As liberdades de expressão e de reunião faziam o seu caminho de abertura a novas práticas de intervenção e de democracia.

Aconteceu a nacionalização da banca e dos seguros, de sectores fundamentais e de empresas, com o controlo operário a crescer e a afirmar-se, ao mesmo tempo que, finda a guerra colonial, se caminhava decisivamente para a independência das ex-colónias. Iniciou-se a reforma agrária, que foi uma grande conquista de Abril e que hoje volta a estar na ordem do dia.

Na Constituição da República, aprovada em 2 de Abril de 1976, ficaram plasmadas tantas e tantas experiências adquiridas no terreno da vida e da luta dos trabalhadores e do povo. Ainda hoje perduram conquistas do 25 de Abril e há necessidade de confrontar a realidade actual e de prosseguirmos na afirmação dessas conquistas, hoje fundamentais para a saída da crise e para a independência nacional.

Depois do 25 de Novembro, e durante muitos anos, em tantos casos até hoje, ficaram raízes e conquistas de Abril, no poder local democrático, na vida associativa, cultural e desportiva, na luta de todos os dias, pelos direitos a uma vida digna, interventiva e transformadora.

A descentralização cultural; as redes de grandes associações e centros culturais; o teatro, a música, as diferentes áreas de intervenção e de desenvolvimento das identidades e culturas; o património cultural e suas associações; as bandas e escolas de música; as escolas e as mudanças positivas na educação e no ensino; as creches e jardins-de-infância; as dinâmicas de trabalho e de resistência que ficaram nas regiões mais desfavorecidas, a afirmar e a defender a revolução do 25 de Abril e os ideais que Vasco Gonçalves e outros militares e civis projectaram na vida de todos nós, devem ser hoje motivo de análise e de prosseguimento do nosso trabalho, na realidade difícil e desafiadora com que somos confrontados.

Daí a justeza da nossa associação, do debate entre nós e com os que defendem e querem o 25 de Abril, na conquista dos direitos fundamentais, na mudança e transformação do nosso país.