RECORDAR A HISTÓRIA

 

RECORDAR A HISTÓRIA
 
Manuel Begonha
Presidente da Assembleia Geral

Em 1932, Salazar foi empossado no cargo de Presidente do Conselho de Ministros e instituiu o chamado Estado Novo. Uma ditadura que adoptou os métodos do sistema político criado na Itália por Mussolini, denominado fascismo.
Este permitiu um historial de violência sobre o povo português, desde o cerceamento das liberdades cívicas, á utilização do livre arbítrio, até ao assassinato dos opositores ao regime.
Esta política repressiva era suportada por uma polícia política, a PIDE, mais tarde DGS, que dispunha de cerca de 22800 funcionários e milhares de informadores.
O regime era apoiado pelos detentores do capital monopolista, latifundiários, a maioria da Igreja Católica e grande parte das Forças Armadas.
Esta situação manteve-se até à morte de Salazar ocorrida em 1970.
Sucedeu-lhe Marcelo Caetano que pouco alterou, até ao golpe militar de 25 de Abril de 1974, a que se seguiu uma revolução popular, cuja fase mais criativa se verificou durante os 4 Governos Provisórios, presididos pelo General Vasco Gonçalves.
Mas, no entanto, os portugueses não deixaram de promover uma activa luta anti-fascista, não podendo ser esquecido o sacrifício dos que a fizeram na clandestinidade.
 
  
Alguns episódios desse combate, tiveram grande impacto na opinião pública e abalaram o regime, recordando entre outros os seguintes :
 
Em 28 de Fevereiro de 1935 foi hasteada na chaminé de uma das maiores oficinas do Barreiro, uma bandeira vermelha e pintada uma foice e um martelo, como protesto contra a repressão sobre os operários.
Em 8 de Setembro de 1936 a ORA(Organização Revolucionária Armada) dirigida pelo PCP, promoveu a Revolta dos Marinheiros, cujo objectivo era levar os navios para o mar e dar um ultimato ao governo com os objectivos referentes à defesa dos seus direitos e ao termo das perseguições e prisões.
Caso o ultimato não fosse atendido, aparecera a ideia de irem a Angra do Heroísmo, libertarem os presos que se encontravam na fortaleza ( entre os quais Bento Gonçalves) e rumarem para um porto onde pudessem ser acolhidos.
 
Em 1937 dá-se um atentado bombista à viatura de Salazar, perpretada pelos anarquistas, no qual esteve envolvido Emídio Santana.
Na luta dos camponeses no Alentejo Catarina Eufémia foi em 19 de Maio de 1954, cobardemente assassinada por um tenente da GNR.
 
Em 8 de Junho de 1958, a campanha para as eleições presidenciais do General Humberto Delgado, mobilizou praticamente toda a oposição, a que se seguiu o seu assassinato pela PIDE.
 
A revolta da Sé que deveria ter saído de 11 para 12 de Março de 1959, acabou frustrada pela PIDE.
Foi liderada por Manuel Serra e pelo major Calafate, tendo nela participado o então capitão Vasco Gonçalves.
 
A fuga de Álvaro Cunhal e outros elementos do Comité Central do PCP da Fortaleza de Peniche em 3 de Janeiro de 1960.
 
A tomada do Paquete Santa Maria, dirigida pelo capitão Henrique Galvão em 25 de Janeiro de 1961.
 
Em 31 de Dezembro de 1961, o assalto ao Quartel de Beja, comandado pelo então capitão Varela Gomes, com quem tive a honra e o prazer de trabalhar na 5ª Divisão do EMGFA.
Dotado de uma enorme cultura política, inteligência, coragem e sempre ao lado da liberdade e da justiça, um homem a quem a Pátria muito deve.
 
As grandes manifestações da classe operária e dos trabalhadores em geral, nas comemorações do 1 de Maio de 1962.
 
As acções da LUAR, fundada por Hermínio da Palma Inácio, activa até 1976, para além de assaltos a bancos, colocou uma bomba que destruiu a casa do gerador de emergência da Corveta João Coutinho em 1970, quando esta estava em construção nos estaleiros da Blohm & Voss, em Hamburgo. Posso testemunha-lo porque me encontrava lá a acompanhar os fabricos.
 
A crise académica de 1969, desencadeada em Coimbra e Lisboa e que envolveu milhares de estudantes em todo o país.
As sabotagens levadas a cabo pela ARA, organização do PCP entre 1970 e 1973, contra objectivos militares.
 
A vigília da Capela do Rato, iniciada a 30 de Dezembro de 1972, conduzida por católicos progressistas. A 31, a polícia de choque, invadiu o edifício e prendeu cerca de 50 pessoas.
 
Destes exemplos muitas vezes heróicos ou trágicos, resultou uma cultura anti - comunista que foi inculcada no nosso povo, uma vez que estes seriam o inimigo da Pátria, das famílias e da Igreja Católica e respectivos padres.
Fui encontrar estas convicções profundamente enraizadas no Centro e Norte do país, no decurso das Campanhas de Dinamização Cultural , logo nos anos de 1974 e 1975.
 
A luta anti-fascista foi concretizada como acima constatámos por várias associações cívicas, envolvendo militares e civis, como católicos, anarquistas, sindicalistas, esquerdistas, monárquicos e republicanos. 
 
Mas o grupo mais flagelado foi sem dúvida o PCP, único partido existente e organizado neste período, fundado em 6 de Março de 1921 em Lisboa, enquanto que o PS apenas o foi em 19 de Abril de 1973 em Bad Munstereifel, Alemanha.
 
A verdade histórica diz-nos que os que foram presos, torturados e assassinados pela PIDE, desde as respectivas instalações na Rua António Maria Cardoso, em Lisboa, nas prisões de Peniche, Aljube, Caxias, Ponta Delgada e várias outras, sem esquecer o Campo de Concentração do Tarrafal em Cabo Verde, eram comunistas na sua grande maioria.
 
Estes factos também explicam porque se não tivesse havido o 25 de Abril, todos os actuais partidos políticos portugueses da direita, conviveriam confortavelmente num país, ainda que sem Marcelo Caetano, mas de acordo com os princípios em tempo definidos por Spínola :
Continuar com a PIDE /DGS travestida ,dedicada a combater o inimigo interno, manter as colónias principalmente Angola e Moçambique até se encontrar uma qualquer solução do tipo federalista e não legalizar o PCP.
 
Finalmente, talvez estes pressupostos ajudem a entender, a histeria anti-comunista que assola a nossa sociedade, valorizando mais alguns erros que certamente foram cometidos, do que um passado de luta e sacrifício que tornou possível vivermos com uma Constituição da República, como a que hoje ainda nos rege.